Lealdade, afinidade e subordinação são atributos mínimos que se exigem dos que se aventuram na penosa tarefa de completar uma chapa eleitoral, sem no entanto almejar ser ‘cabeça’. Afinal, a insubordinação pode custar a sua cabeça.
*Por Marcelo Jorge - Durante as eleições para o Executivo, todas as atenções estão voltadas (e isso é natural) para os candidatos titulares das chapas concorrentes. Porque são essas pessoas que assumirão o cargo de prefeito, governador ou presidente caso sejam eleitas. O que não podemos ignorar é que ao lado de cada um desses candidatos encontramos uma figura ilustre: o candidato a vice (seja a vice-prefeito, vice-governador ou a vice-presidente). Sem muitas funções oficiais além de substituir o titular do cargo, a existência dessa figura é muitas vezes ignorada, o que é problemático.
Há muito discute-se no ambiente político, se um vice é pedra angular ou pedra de tropeço. Para iniciar é bom que se saiba que o papel de um vice na iniciativa privada (presidente, diretor, coordenador, etc) é bem diferente do cargo na arena política. Até porque, no mercado corporativo, a alta concorrência exige muito dos profissionais, o que se estende a todos sem exceção e ao vice líder é cobrada a mesma competência do seu superior imediato, devendo estar ‘afiado’ e sempre pronto para substituir o titular. Caso contrário, uma eventual ausência do ‘cabeça’ sem a devida substituição à altura pode significar milionários prejuízos em razão das importantes decisões a serem tomadas de forma ágil.
Já no cenário político, é atribuição do Vice-Prefeito auxiliar o Gabinete do Prefeito. Além disso, em caso de renúncia, morte, cassação ou impeachment do titular, é o vice que herda seu cargo. Só que no período pré-eleitoral a escolha do vice se dá, com raríssimas exceções, por conveniências específicas, sejam estas alianças, imposições partidárias, indicações de aliados (ou financiadores), disponibilidade financeira do próprio candidato a vice ou pesquisas/avaliações públicas que sugerem a necessidade de incluir-se um nome com aprovação popular para fortalecer a chapa.
Mas, somente quando a dupla assume o poder, após a festas, as diferenças do público para o privado tornam-se exponenciais.
A postura discreta do vice, fugindo de qualquer protagonismo ou vaidade, determina sua vida política mais duradoura dentro do grupo. Dependendo do grau de afinidade e confiança do ‘número 2’ com o gestor, ele pode ser convidado a participar na administração com maior profundidade. Caso contrário, este deve-se contentar com o nome gravado com letras menores nas placas inaugurais – ou nem isso –, raras agendas públicas, rápidas citações nos eventos, assunção esporádica do cargo com pouca – ou nenhuma – autonomia, mas o salário integral mantido. Quando não existem outras ambições presentes, a maioria dos vices se contenta com este último item.
Falando de gestões municipais, os prefeitos buscam também vices discretos e que colaborem, mas sem ‘aparecer demais’ para não ofuscar o protagonismo do eleito para ser o cabeça e desta forma se ampliam as chances de manutenção da chapa, no caso de reeleição. É claro que em meio a tudo isso existem as exceções: vices que são bons articuladores e que chegam onde o prefeito não conseguiu chegar, apagando incêndios e viabilizando a governabilidade.
Enfim: O vice que compreende seu papel de não estar aquém ou além nas suas atribuições, corre menos risco de decapitação política.
Em Pernambuco, Gustavo Krause, pai da atual deputada estadual Priscila, desempenhou com eficiência seu papel de vice-governador na chapa encabeçada por Roberto Magalhães (PDS) posteriormente assumindo o posto de governador de 1986 a 1987, em decorrência do afastamento de Magalhães, para disputar a eleição de senador.
VICES NO INTERIOR
No interior de Pernambuco nos últimos anos, alguns vices adquiriram protagonismo e decidiram ‘peitar’ seus ex-aliados gestores. Em municípios como Sirinhaém, São Bento do Una,Tamandaré, Cedro, São Lourenço da Mata, Ibimirim e mais recentemente Arcoverde, foram registrados rompimento dos vices com os prefeitos. Já Lajedo, no agreste, teve a assunção do vice por motivo de morte do titular, ex prefeito Adelmo Duarte, poucos meses após o início do seu Governo. Neste caso, a posse do vice como titular, causou o rompimento do grupo que possibilitou a vitória de ambos.
VICE-PREFEITOS EM GARANHUNS
Em Garanhuns, agreste de Pernambuco, os vices não costumam ‘dar trabalho’ aos seus chefes diretos, registrando-se no entanto algumas exceções nas últimas décadas: A participação do vice-prefeito Dr. Márcio Quirino, cujo nome na propaganda eleitoral era grafado com letras nas mesmas dimensões do candidato a prefeito Silvino Duarte durante a sua primeira campanha no ano de 1996, teve um mandato inicial exitoso, mas vida política breve: Após assumir a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e iniciar a construção do seu nome, já no segundo mandato, após desentendimentos internos, o Vice rompeu com o prefeito, ficando Quirino inclusive proibido de frequentar o próprio gabinete no Palácio Celso Galvão e ambos chegaram a finalizar seus mandatos em 2004, mas com relações cortadas.
A gestão seguinte, do comerciante Luiz Carlos de Oliveira (MDB), tendo como vice o biomédico Almir Penaforte, transcorreu de forma tranquila e assim foram cumpridos dois mandatos de um ‘casamento’ bem sucedido. Até o presente, o alvirrubro Penaforte continua muito querido pela população e mantém sua discrição na vida pessoal, afastando-se no entanto da vida pública.
Já o prefeito eleito em 2012, Izaías Régis (à época no PTB), iniciou o seu governo após acordos e alianças que definiram a sua vitória ao lado da sua vice-prefeita Rosa Quidute (PT). Ainda no primeiro mandato, ruídos internos quebraram a confiança do gestor na companheira de chapa, acentuados ainda mais quando durante ausência do prefeito para viagem ao exterior – uma das prerrogativas para que o vice assuma -, a mesma tomou decisões que, segundo o que foi apurado à época, não estavam na pauta deixada pelo prefeito, irritando o chefe do executivo. Quando reeleito já em 2016, Régis teve como companheiro de chapa o ex-vereador Haroldo Vicente, caracterizando estes derradeiros 04 anos como uma parceria perfeita: Companheiro nas agendas de governo, referendado pelo gestor, Vicente acompanhava inclusive as entrevistas concedidas pelo prefeito aos veículos de comunicação, viagens a Brasília e chegou a ocupar por diversas vezes o cargo maior do município. Prova dessa fidelidade e reconhecimento inclusive, foi demonstrada na indicação inicial de Izaías ao nome de Haroldo para sucedê-lo nas eleições de 2020, o que no entanto por outras conjunturas não veio a ser efetivado.
Na atual gestão, mesmo de forma discreta, já percebe-se falta de sintonia entre o vice prefeito Dr. Pedro Velôso (PT) e o Prefeito Sivaldo Albino (PSB), que já não são vistos juntos como na memorável campanha vitoriosa. Após a formação da chapa eleitoral cuja entrada do PT, segundo analistas, garantiu a vitória do grupo até então com números instáveis nas pesquisas, o lançamento do nome do filho do gestor para uma pré-candidatura a Deputado Estadual, vem causando rupturas. O motivo é exatamente a disposição de Veloso em também disputar uma cadeira na ALEPE, o que possivelmente fez parte dos acordos pré-eleitorais e que, com a decisão de Albino, não contará com o apoio do prefeito e aliados.
VICES FEDERAIS
Em nível nacional, nomes como João Goulart (substituiu Jânio Quadros e depois foi substituído por uma Junta Militar) e já após a redemocratização Itamar Franco (assumiu após impeachment de Fernando Collor); José Sarney (vice de Tancredo Neves – este faleceu antes mesmo de assumir o cargo) e mais recentemente Michel Temer (tomou posse após afastamento de Dilma Rousseff) demonstram que com vice não se brinca.
Em algumas situações ele pode sair do banco de reservas, entrar como titular na partida e até mudar o jogo.
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